Eu sempre soube que algo doía, guardado, secreto, submerso nas palavras, disfarçado numa gargalhada desesperada. É que eu tinha em mim uma criança machucada, assustada, sozinha no escuro, com frio. E eu não sabia curar as feridas que ela me trazia. O dia que encarei o meu merecimento pela felicidade, peguei essa menina maculada e pus no colo. Deixei que ela chorasse e só então estabelecemos um contato real. Ela me disse que eu não estava cuidando bem de nós duas. Havia muita negligência minha durante todo o tempo em que ela pedira socorro. Havia muita angústia como  bagagem e eu sempre pagava caro pelo excesso de peso.

Sei que não consegui trazer de volta a minha essência, que é a alegria, de um dia para o outro. Foi um trabalho árduo, corajoso e cansativo, além de diário.Foram meses perdoando, sentindo sem julgamento,aprendendo a me olhar no espelho até enxergar o meu rosto. Meu coração estava na UTI e eu não havia percebido ainda.Hoje, eu resgatei uma criança interior que tem uma infância emocional cheia de mordomias. Essa criança também tem rotina, horários, novos amigos, lápis de cor e um parque de diversões interno só pra ela: uma montanha russa de sentimentos que carregamos por dentro.

Essa criança interior teve cada uma de suas feridas curadas: em algumas eu precisei usar um bisturi antes de fazer os curativos.
A criança assustada estava num lugar chamado fundo do poço. Hoje ela tem colo e é tratada com toda a amorosidade que um ser humano merece. E já consegue andar confiante por aí, com as próprias pernas, porque ela sabe que sempre terá para onde voltar.

A única promessa que eu fiz a esta criança quando consegui enxergar as primeiras rugas do meu rosto, é que eu nunca vou deixar que ela envelheça.

Marla de Queiroz

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